REVISTA ZONA DE IMPACTO. ISSN 1982-9108, VOL. 11, JAN-JUN, ANO XI, 2009. 


POESIA E HISTÓRIA


NILZA MENESES

CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO HISTÓRICA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE RONDÔNIA
nilzamenezes@hotmail.com


Resumo: Este artigo tem por objetivo demonstrar como a poesia serve de fonte, construção e subsídio para o historiador entender os acontecimentos, saber do momento social, econômico e político dos vários ângulos para se saber a situação emocional de um povo em certo momento.

Palavras-Chave: Poesia, História, Sociedade e Entendimento.

Abstract: This article has for objective to demonstrate as the poetry it serves as source, construction and subsidy for the historian to understand the events, to know of the moment social, economical and political of the several angles to know the emotional situation of a people in certain moment. 

Key-words: Poetry, History, Society and Understanding. 


            A poesia, dizem, é conversa emocionada e através dela se pode registrar, para a História, o espírito do vivido.
            Ela vem impregnada de parcialidade, fala por metáforas, lê-se nas entrelinhas. Ao servir como fonte para a construção da História, é subsídio vivo para o historiador, porque o poeta como ser social, através do seu sentir vai passar os sentimentos e pensamentos. Através da manifestação verbal é transmitido um juízo (Pound, 1997).
            Não se pode negar a influência da História na poesia e vice-versa, e, em se falando em poesia, dentro da visão de que não basta apenas narrar fatos, mas sim questioná-los, para que através da crítica se possa entender os acontecimentos, saber do momento social, econômico e político dos vários ângulos para se saber a situação emocional de um povo em certo momento, aí sim a poesia vai estar e servir como um dos meios a serem utilizados para que esse povo possa falar da sua historicidade, para o momento histórico.
            Para Kandinski, “toda obra de arte é filha do seu tempo e muitas vezes, mãe dos nossos sentimentos”. A poesia reflete muito bem esse conceito, através dela o artista expressa sua parte mais natural, a fala.
            Poetas inspirados e qualificados como regionalistas fazem uso da fala emocionada como forma de registrar o seu olhar ao derredor. Vamos adentrar a fantasia e visão do poeta para procurarmos na alegoria do texto o que ele quis dizer.
            Bate-Batelão, do poeta Basinho, vem matreiro e regional contar da ansiedade do povo da região do Estado de Rondônia desde a invasão do sulista, trazendo para a região outros costumes. O beradeiro, como gosta de ser chamado o homem da região próxima aos rios amazônicos, passa a sofrer a influência do Sul do País que é para ele um choque cultural, e mais que isso uma agressão à realidade de antes.
            Macaxeira vai virar mandioca e não mais imaginar-se na rede gostosa por tardes afora, porque embora recente é nesse momento que Rondônia entra em tempos capitalistas, não como um colônia que era, e alimentava o Brasil e o mundo com borracha, ouro, cassiterita, etc..., mas sim produzindo e recebendo além de pessoas, produtos. Isso é um momento de transição.
            Batelão, barco usado na região como transporte para os ribeirinhos. Muito usado nos tempos da borracha, objeto integrado ao modo de vida do povo nativo da região amazônica, que com o “progresso matreiro”, como diz Basinho, vai ficar em desuso.
            O poeta neste texto vê a passagem do lado do homem nativo, a sua importância diante do novo que surge, e vê a aculturação que está acontecendo. Fala no seu poema não como um protesto, mas com nostalgia. Emprega termos e produtos regionais, como forma de guardar essa cultura que está sendo “esmagada” pela chegada do “progresso” que é o sulista invadindo, derrubando matas, abrindo fazendas, colocando barcos motorizados etc...
            Bate-Batelão é um poema que passa para a História a cultura do beradeiro, do grito pela sua aculturação. Fala como povo nativo da angústia que a mudança vai causar, embora não contestada (Loureiro, 1995).
            Rondônia vai contar no momento da invasão do sulista com uma população já mesclada pelos colonizadores, soldados da borracha e índios. O nordestino vem para cá não para trazer, mas para ser e vai adaptar-se a região e suas circunstâncias sem causar modificação, acrescentando apenas expressões como “jerimum” que vão ser incorporadas como sendo da região fazendo parte da cultura como identidade do povo. O sulista, ao contrário não vem para sobreviver nem para conhecer, vem com um projeto, uma meta e, chega derrubando seringais, plantando suas roças e trazendo o seu mundo para dentro do mundo dos beradeiros, e aí vai causar o choque e as mudanças. Vai ao mesmo tempo, fascinar e angustiar e a forma de protesto vai ser a hostilidade muitas vezes observadas nas colocações do que é da região e do que é de fora, sendo muitas vezes, o sulista colocado como o responsável pela depredação (Loureiro, 1995).
            Quando Basinho fala: “Singra tua sina cabocla/barcaça dos beradeiros...” fala do que era para o povo da região verdade. “Batelão bate ligeiro, companheiro/ que o progresso é matreiro/ e vem aí pra te esganar.” Esse esganamento é registrado na mistura de culturas, o progresso não vem no caso de Rondônia esganar porque não é uma dominação à força, ela é sim de influências trazidas, impostas e aceitas, e há nesse impor e aceitar uma troca. Por esse motivo transição.
            Através da poesia, percebemos de maneira simplificada o registro dos símbolos da região. O barco, o açaí, o mesticismo já aceito, as águas barrentas do Rio Madeira, as frutas, os peixes, mas principalmente a possibilidade da leitura.

Bate-Batelão

Bate bate batelão nativo
singra tua sina cabocla
barcaça dos beradeiros
Bate bate batelão mestiço
leva contigo a gente ameríndia
a borracha que não mais existe
e deixa triste a cunhã que te perdeu.

Bate no meu peito batelão aflito
e pulsa bam bam meu coração tan-tan
arde estreito na garganta um grito
e eu sei do grito que te quer Tupã.

Bate bate batelão cativo
leva meu povo sem voz
por sobre as águas barrentas
do meu sangue açaí
Trotando vais potro aventureiro
e da morena ribeirinha leva o cheiro
que ela um dia roubou do jenipapo.

Leva o ócio, o jerimum e o tambaqui,
a tapioca, o tucupi e o guaraná
Bate bate ligeiro, companheiro
que o progresso é matreiro
e vem aí pra te esganar.

BIBLIOGRAFIA

KANDISNKI, Wassily. DO ESPIRITUAL NA ARTE. Martins Fontes, São Paulo, 1996.
LOUREIRO, José de Jesus Paes. CULTURA AMAZÔNICA: UMA POÉTICA DO IMAGINÁRIO. Cejup, Belém, 1995.
POUND, Ezra. ABC DA LITERATURA. Cultrix, São Paulo, 1997.